Neste artigo, você vai saber quem é o escritor Machado de Assis. E conhecer a história de seu conto Pílades e Orestes. Essa sutil e irônica narrativa mostra a forte união entre dois amigos (quase) inseparáveis: Gonçalves e Quintanilha. Cabe ao leitor crítico dizer se o que os une é o amor, o desejo ou o interesse. E você que gosta dos conteúdos do site Literatura!, conheça também os livros de seu autor. É só clicar aqui.
Quem é Machado de Assis?
Joaquim Maria Machado de Assis é um escritor brasileiro. Ele nasceu, no Rio de Janeiro, em 21 de junho de 1839 e faleceu em 29 de setembro de 1908, na mesma cidade. Seus pais, pessoas pobres, viviam como agregados na chácara que pertencia à madrinha do escritor.
Por volta de 1856, Machado de Assis passou a trabalhar como aprendiz de tipógrafo. Dois anos depois, assumiu o cargo de revisor, além de estudar francês e latim. Com vinte e um anos, já escrevia para periódicos da época. E, anos depois, em 1869, se casou com a portuguesa Carolina Augusta Xavier de Novais (1835-1904).
O autor, além de funcionário público, foi poeta, cronista, contista, romancista e dramaturgo. Iniciou sua carreira literária como escritor romântico e introduziu o Realismo no Brasil com seu romance Memórias póstumas de Brás Cubas, em 1881. Assim, apesar de ter nascido pobre e negro, ser gago e epiléptico, teve sucesso como escritor no século XIX e é considerado, por alguns, o maior escritor brasileiro.
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Qual é a história do conto Pílades e Orestes, de Machado de Assis?
O título do conto faz referência a dois personagens gregos, os primos Pílades e Orestes. Entre eles, há uma forte amizade. Portanto, os personagens machadianos Quintanilha e Gonçalves são, implicitamente, comparados a eles. Afinal, os protagonistas do conto também são unidos por uma forte amizade.
O narrador afirma, no início da narrativa, que “Quintanilha engendrou Gonçalves”. Assim, ele quer dizer que os dois são tão unidos quanto pai e filho, apesar de não se parecerem e serem “quase da mesma idade”. Porém, Quintanilha trata Gonçalves como um pai trata um filho, pois, como nos diz o narrador, “um pai não se desfaria mais em carinhos, cautelas e pensamentos”.
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Quando Quintanilha recebe uma herança de um tio, precisa enfrentar “o ódio dos parentes”, o que quase o faz “abrir mão dela”. Porém, Gonçalves o convence do contrário. Também é por influência de Gonçalves que Quintanilha não se reconcilia com os parentes arrependidos, que estariam com segundas intenções.
Os dois amigos são inseparáveis, como nos conta o irônico narrador machadiano:
Quintanilha acordava, pensava no outro, almoçava e ia ter com ele. Jantavam juntos, faziam alguma visita, passeavam ou acabavam a noite no teatro. Se Gonçalves tinha algum trabalho que fazer à noite, Quintanilha ia ajudá-lo como obrigação; […]. Às vezes, na Rua do Ouvidor, vendo passar as moças, Gonçalves lembrava-se de uns autos que deixara no escritório. Quintanilha voava a buscá-los e tornava com eles, tão contente que não se podia saber se eram autos, se a sorte grande; procurava-o ansiosamente com os olhos, corria, sorria, morria de fadiga.
São tão unidos, que “uma senhora chamava-lhes os ‘casadinhos de fresco’, e um letrado, Pílades e Orestes”. No entanto, percebemos que o amor de Quintanilha é bastante servil: “Em verdade, Quintanilha era muito sensível a qualquer distinção; uma palavra, um olhar bastava a acender-lhe o cérebro. Uma pancadinha no ombro ou no ventre, com o fim de aprová-lo ou só acentuar a intimidade, era para derretê-lo de prazer”.
Quintanilha acaba fazendo um testamento em benefício de seu grande amigo. Porém, entra na história uma figura feminina: Camila, a prima de Quintanilha. Ele, segundo o narrador, “acabou gostando da moça” e “descobriu um dia de manhã que sonhara com ela a noite toda, e à noite que pensara nela todo o dia”.
Dessa maneira, ele conclui “que a amava e era amado”. Mas, ao contar sua descoberta ao amigo, Gonçalves “empalideceu”. E, ao se recobrar da surpresa, “sacudiu os ombros, com ar desenganado”. Então: “— Gonçalves, que é isso? perguntou Quintanilha, pegando-lhe nas mãos, assustado”.
Sem entender a reação do outro, Quintanilha acaba concluindo “que o amigo Gonçalves era seu rival, amava a prima dele, era talvez amado por ela…”. Então, desiste do casamento em favor do amigo. Assim, “serviu de testemunha ao noivo”. E, mais tarde, “de padrinho aos dois primeiros filhos”. Porém, um dia, “levando doces para os afilhados, atravessava a Praça Quinze de Novembro, recebeu uma bala revoltosa (1893) que o matou quase instantaneamente”.
Então, leitor sagaz, que tal ler esse conto de Machado de Assis (é só clicar aqui) e, a partir dos detalhes, me dizer se Gonçalves e Quintanilha eram apenas grandes amigos ou se havia algo mais? Além disso, não se esqueça de que havia uma fortuna em jogo e, com a morte de Quintanilha, Gonçalves foi o grande beneficiado.
O homoerotismo na obra Pílades e Orestes, de Machado de Assis
O homoerotismo está presente na amizade entre Gonçalves e Quintanilha. Isso se consideramos homoerotismo como a atração entre pessoas do mesmo sexo. Essa atração pode estar relacionada ou não a um desejo sexual. Aliás, o conto é sutil nesse aspecto. Não é possível dizer se há algo mais na amizade dos dois.
A questão do casamento com Camila não exclui a possibilidade do sexo entre os amigos. Essa personagem feminina não inspira paixão. O casamento é tratado de forma racional, pois é uma obrigação social para homens burgueses do século XIX. Nesse ponto, o narrador deixa bem claro que paixão mesmo sente Quintanilha por Gonçalves.
E, ao dizer que “uma senhora chamava-lhes os ‘casadinhos de fresco’, e um letrado, Pílades e Orestes”, o narrador planta a dúvida acerca de um possível relacionamento afetivo-sexual entre os amigos. Não esqueçamos que as relações homoeróticas eram bem-vistas na Grécia antiga, daí a referência a Pílades e Orestes ser tão sugestiva.
Então, você quer saber mais sobre Machado de Assis e sua esposa? É só ler o livro infantojuvenil Au revoir, Carolina. Assim, você pode viajar no tempo e, a partir dessa narrativa de ficção, conhecer um pouco mais sobre a literatura brasileira.
Leia também este livro: Homoerotismo em foco.
Referências
CARVALHO, João Belisário de. Sobre o trágico e a teoria da amizade. Ethica, Rio de Janeiro, v. 15, n. 1, p. 43-57, 2008.
MACHADO DE ASSIS. Pílades e Orestes. In: MACHADO DE ASSIS. Relíquias de casa velha. Rio de Janeiro/ Belo Horizonte: Livraria Garnier, 1990. p. 88-97. (Coleção dos Autores Célebres da Literatura Brasileira, v. 16).
MEC. Machado de Assis: vida e obra. Acesso em: 07 set. 2021.
* Carole Raddato, licença creative commons.
** Machadodeassisreal, licença creative commons.
Este artigo foi escrito por: Warley Matias de Souza.